O empresário Lair Ferst,, acusado de ser um dos pivôs do desvio de R$ 44 milhões do Detran-RS, envolveu ontem pela primeira vez a governadora Yeda Crusius (PSDB) na fraude.
Uma semana depois de se desfiliar do PSDB, Ferst -que ajudou a coordenar a campanha de Yeda em 2006- afirmou em entrevista exclusiva à Folha que foi uma decisão da cúpula do governo reestruturar o esquema de desvio.
O empresário negocia com o Ministério Público Federal e com a Justiça implicar cerca de dez nomes de integrantes e ex-integrantes do primeiro escalão do governo gaúcho, além de pessoas com foro privilegiado, em troca da retirada de parte das acusações contra ele.
Ferst é réu em ação criminal com outras 39 pessoas. Ele responde, entre outras acusações, por corrupção ativa e extorsão. A Folha apurou que essa é a segunda tentativa dele de fazer um acordo. A primeira foi vetada pela Justiça em abril.
As novas informações que Ferst promete acrescentar se referem à chamada “fase dois” da fraude -quando o Detran substituiu, em maio de 2007, a Fatec pela Fundae, ambas fundações ligadas à Universidade de Santa Maria.
As investigações apontam que a troca ocorreu para retirar as empresas da família Ferst do esquema e beneficiar empresas ligadas a integrantes do aliado PP. Mesmo assim, até então, o empresário havia assumido posição de defesa da governadora -negando inclusive qualquer proximidade com a tucana. “Procurei não potencializar essa relação em razão do clima quente do debate político que se travou na CPI [da Assembléia Legislativa], eu não achava que era conveniente servir de munição para a oposição.”
Agora, Ferst afirma que era amigo da governadora e que foi recebido mais de uma vez por Yeda depois da posse. Segundo ele, a reestruturação da fraude, com a troca de fundações, foi decisão política do governo. “É público e notório que houve o envolvimento da governadora nesse processo”, disse ele.
O empresário afirma que as informações que prestará ao MPF irão envolver pessoas próximas a Yeda. A crise já derrubou cinco integrantes do primeiro escalão, alguns deles citados por réus em grampos realizados pela Polícia Federal na Operação Rodin.
A reavaliação de sua estratégia de defesa ocorreu após o cancelamento do depoimento que prestaria à Justiça Federal no dia 20. Aprovada este ano, a lei 11.689 altera o curso do processo criminal, deixando para a última fase os depoimentos dos réus. Além da razão processual, Ferst mostra-se magoado com o “abandono” de tucanos.
Na semana passada, Ferst foi impedido pela PF de sacar R$ 200 mil em agências bancárias de Porto Alegre. Ele diz que o dinheiro é lícito e que vai acionar judicialmente a PF pelos abusos que afirma ter sofrido.
“É notório o envolvimento da governadora”
Abaixo os principais trechos da entrevista em que o empresário Lair Ferst envolve governadora Yeda Crusius (PSDB) em fraude:
FOLHA – A troca de fundações foi fruto de decisão do governo?
LAIR FERST – Não seria possível essa mudança sem orientação política de governo, sem respaldo político.
FOLHA – Da governadora?
FERST – Na CPI do Detran, o próprio [ex-] presidente do Detran, Flávio Vaz Netto, disse que teve reuniões tratando deste assunto [com Yeda]. Ela se reuniu também com sindicatos de examinadores. É público e notório que houve o envolvimento da governadora neste processo. […] Aparecerão nomes que não foram nem citados no inquérito. Há vários personagens que não foram citados que poderão a ter sua participação esclarecida.
FOLHA – Qual é a sua relação com o governo?
FERST – Tenho amizade com a maioria dos integrantes do governo, mas isso não quer dizer que tenha qualquer vínculo com o governo.
FOLHA – E com a governadora?
FERST – Inclusive com a governadora.
FOLHA – Por que o sr. não falou isso antes?
FERST – Eu procurei não potencializar essa relação em função do clima quente do debate político que se travou na CPI. Havia interesse claro de atingir o governo, eu não achava que era conveniente que eu servisse de munição para a oposição.
FOLHA – Por que deixou o PSDB?
FERST – Para que eu ficasse livre de citações e vinculações políticas e para deixar o partido à vontade. Nem todo partido se sente à vontade com um filiado sub judice.
Outro lado
Por meio de sua assessoria de imprensa, a governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius (PSDB), que cumpria agenda em Brasília ontem, afirmou que não tomou conhecimento da fraude do Detran antes da deflagração da Operação Rodin, da Polícia Federal, em novembro do ano passado.
“Se ela tivesse tido conhecimento, teria feito o que sempre faz quando surge alguma denúncia: mandado apurar”, disse o assessor Joabel Pereira, repetindo um argumento já apresentado anteriormente pela governadora quando foi questionada sobre o assunto.
O governo também nega que Lair Ferst, empresário acusado de ser um dos líderes do desvio de R$ 44 milhões no Detran, tenha sido recebido pela tucana depois que ela foi empossada governadora. Pereira também negou a relação de amizade citada pelo empresário.
ANA FLOR e GRACILIANO ROCHA Folha de S. Paulo
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