Arquivo do dia: julho 28, 2013

SAÚDE: 70% do sal consumido no Brasil é adicionado aos alimentos pelo consumidor

sal-alimento-rico-em-iodo[1]O brasileiro consome duas vezes mais sódio do que o recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e a maior parte disso deve-se à adição de sal de cozinha à comida pelos próprios consumidores, segundo um levantamento feito pela Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação (Abia). Apenas um quarto é proveniente de alimentos industrializados, segundo a pesquisa, que transfere para os consumidores a maior responsabilidade sobre a redução do consumo excessivo de sódio e dos seus efeitos malignos sobre a saúde.

“O grande inimigo é o sal comprado”, disse ao Estado o presidente da Abia, Edmundo Klotz. “Não nos isentamos da nossa parcela de responsabilidade, mas é uma verdade que precisa ser dita. Não somos nós que estamos envenenando as pessoas.”

O estudo foi compilado pela Abia, mas é baseado em dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – mais especificamente, da Pesquisa Anual de Serviços de 2009 e da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2008-2009. “Inventava-se um monte de histórias sobre nós e não tínhamos uma pesquisa para rebater essas críticas. Então pegamos uma pesquisa neutra, feita pelo governo por outros motivos, e achamos as respostas que precisávamos”, afirma Klotz. “Os dados são incontestáveis e altamente confiáveis.”

 

Questionamentos. Outros especialistas discordam do cenário apresentado pela pesquisa. “Não é isso que a gente vê no dia a dia do consultório ou nas avaliações clínicas do hospital”, afirma o médico Luiz Bortolotto, diretor da Unidade de Hipertensão do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da USP. “A fonte principal costuma ser o produto industrializado, inclusive o pão francês.”

“É um parecer da indústria. Não concordo do ponto de vista médico”, avalia a nutricionista Cristiane Kovacs, responsável pelo Ambulatório de Nutrição Clínica do Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia. “Não é essa a realidade que vemos nas entrevistas com os pacientes. Quando você coloca tudo na ponta do lápis, o maior vilão é o alimento industrializado.”

Ela chama atenção para o fato de que o sódio, por si só, não tem sabor (é usado na indústria principalmente como um conservante), e por isso muita gente consome a substância sem saber, acreditando que o que faz mal à saúde é o sal. “O paciente reduz o sal na comida, mas acaba comendo sódio de outras maneiras”, explica Cristiane. Um erro comum, segundo ela, é trocar o sal de cozinha por temperos prontos, industrializados, que possuem alto teor de sódio. Por isso, é importante olhar o rótulo dos produtos antes de consumi-los – e não apenas dos produtos salgados. “Até adoçante tem sódio”, aponta Cristiane.

Os alimentos com maior teor da substância, segundo ela, são os prontos para consumo e com prazo de validade mais longo (que utilizam o sódio como conservante), como salsichas, nuggets, bolachas e salgadinhos. “As mães precisam pensar muito na hora de preparar a lancheira dos filhos”, alerta.

“Todo mundo tem culpa, a indústria, o governo e o consumidor”, diz a nutricionista Marcia Fideliz, presidente da Associação Brasileira de Nutrição (Asbran). “Ainda que a parcela da indústria seja menor, isso não a exime de culpa. Tem um monte de produtos no mercado com muito mais sal e sódio do que deveria, porque assim fica mais gostoso e é mais fácil de vender. Por que só lançam produtos com sal? Por que não oferecem opções mais saudáveis para o consumidor?”

Acordos de redução. Nos últimos dois anos, a indústria assinou com o Ministério da Saúde três acordos para redução de sódio em uma série de alimentos, incluindo macarrão instantâneo, pães, bolos, salgadinhos, cereais matinais, margarina, maionese, caldos e temperos preparados. Os acordos estabelecem limites máximos de sódio para cada tipo de produto, de modo que o porcentual de redução exigido varia de acordo com os teores de cada marca.

No caso dos biscoitos doces recheados, por exemplo, o teor máximo acordado (para ser atingido até 2014) é de 265 miligramas de sódio para cada 100 gramas de alimento, o que exigirá uma redução de até 55% dos teores atuais, no caso de algumas marcas, segundo informações da Abia. Nas margarinas vegetais, o corte poderá chegar a 56% até 2015, enquanto que no pão francês, a redução média chegará próximo de 10%.

As metas são estabelecidas com prazo de cumprimento de dois anos. Um quarto acordo está sendo negociado agora para redução de sódio em embutidos, laticínios e refeições prontas.

Segundo a coordenadora-geral de Alimentação e Nutrição do Ministério da Saúde, Patricia Jaime, os produtos selecionados são aqueles que mais contribuem para o consumo de sódio na dieta da população.

O objetivo é reduzir gradualmente os níveis de sódio dos alimentos brasileiros, até atingir os níveis mais baixos praticados no mundo. “Não dá para fazer uma redução drástica de uma vez só; tem de haver um tempo de adaptação do paladar do consumidor e das tecnologias de produção na indústria”, ressalta ela, lembrando que o sódio é um ingrediente básico de consistência, estabilidade e conservação dos alimentos.

Segundo o estudo, o brasileiro consome em média 4,46 gramas de sódio por dia (o limite recomendado pela OMS é 2 gramas), sendo que 23,8% disso é ingerido por meio de produtos industrializados ou semielaborados (como macarrão, pães, salsichas, bolachas, salgadinhos, carne ou frango temperados), 4,7% via alimentos in natura (como frutas e verduras) e 71,5%, via sal de cozinha, que é adicionado à comida na forma de tempero.

“É basicamente na sua casa que você está consumindo muito sal”, diz o endocrinologista Alfredo Halpern, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, convidado pela Abia a comentar o estudo. “O mais importante é educar o consumidor; não adianta só jogar a culpa na indústria porque isso não vai resolver o problema.”

“O vilão não é a indústria, é o estilo de vida”, diz o médico Daniel Magnoni, chefe dos serviços de Nutrologia e Nutrição Clínica do Hospital do Coração (HCor). Um dos principais problemas, segundo ele, é a tendência cada vez maior de as pessoas comerem fora de casa, em lanchonetes, padarias e restaurantes self-service. “O alimento fora de casa costuma ter mais sal, porque é mais ao gosto do brasileiro”, diz.

 

FONTE  Herton Escobar / O Estado de S. Paulo

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