Arquivo do dia: outubro 9, 2010

Pedofilia: Xuxa ganha ação contra o Google

Xuxa venceu uma ação contra o Google para não ter mais o seu nome vinculado à pedofilia no maior site de buscas do mundo.

Até ontem, quem digitasse no Google o nome de Xuxa e o adjetivo pedófila teria acesso a 50100 textos e vídeos e mais 21400 fotos da apresentadora, em parte delas nua ou em cenas de sexo (tiradas de um filme que fez em 1982).

Pois bem, agora o Google terá de retirar todas essas referências do seu site por determinação judicial.

Xuxa venceu na semana passada uma ação contra o maior site de buscas do mundo. A decisão, em primeira instância, da Justiça do Rio de Janeiro é clara: se não o fizer, o Google terá de pagar 20 000 reais por cada “resultado positivo” de busca.

Além disso, terá de pagar outros 20 000 reais por foto ou vídeo de Xuxa “sem vestes”.

Radar/ Lauro Jardim


Releitura: Paulo francis e o assassinato de John lennon

Na data em que John Lennon faria 70 anos é muito oportuna a releitura deste artigo de Paulo Francis. Trata do assassinato de John Lennon e daquilo que o jornalista definiu como canibalismo de celebridades . Só o título do artigo, escrito ainda no calor do assassinato,  já encerra um tratado sobre o assunto.Publicado na Folha de S. Paulo de 10.12.1980.

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CINCO TIROS ABREM NOVOS NEGÓCIOS 

Paulo Francis

John Lennon, compositor, cantor, músico, o “pai” dos Beatles, foi assassinado à uma hora da manhã (hora de Brasília) de ontem, por um vagabundo, Mark Chapman, que disparou nele seis tiros de um revólver 38, acertando cinco. O crime aconteceu no saguão de um dos prédios mais famosos de Nova York, a oeste do Central Park, o Dakota (que a maioria dos brasileiros conhece como cenário do filme de Roman Polanski Rosemary’s baby, com Mia Farrow e John Cassavetes). Lennon estava acompanhado da mulher, Yoko Ono, e dois cavalheiros ainda não identificados.

Chapman esperou por ele horas no saguão, sem ser incomodado pelos agentes de segurança do prédio (cuja maioria dos moradores é celebridade, gente como Lauren Bacall etc.) que provavelmente, como é freqüente em Nova York, estavam bêbados ou dormindo. Lennon tinha 40 anos. Chapman, de Atlanta, Geórgia, conterrâneo de Jimmy Carter, tem 25.

A polícia, chamada ao local, apreendeu facilmente Chapman, que largou o revólver depois de esvaziá-lo, sorrindo, certo (e está certíssimo) que do anonimato se tornará, como Lennon, uma celebridade. Esse o motivo aparente do crime. O canibalismo de celebridades que é rotina neste país (e no Brasil e todo o mundo ocidental), graças a um sistema de comunicações que evita assuntos sérios, mas que fornece um “circo” permanente, obsessivo, avassalador, sobre a vida dos bem-sucedidos e ricos, excitando sentimentos contraditórios, da adoração bocó dos fãs à frustração homicida, que às vezes se manifesta a la Chapman.

É tolice atribuir o crime à violência de Nova York. Chapman estava em Nova York havia apenas duas semanas, proveniente de Atlanta (trabalhou um tempo no Havaí, como guarda de segurança, vulgo “vigia”). Em Nova York não é possível comprar armas de fogo sem extensa e prévia investigação policial (estou falando do mercado legal, naturalmente). Em Atlanta, onde recentemente 12 crianças negras foram assassinadas, é possível comprá-las em qualquer armazém…

A polícia de Nova York é treinada em paramedicina. Tentou ressuscitar Lennon, aplicando-lhe técnicas recomendadas, sem sucesso. Uma ambulância recolheu Lennon, que ainda falou aos médicos, dizendo quem era (”Meu nome é John Lennon”) mas foi pronunciado “D.O.A.”, morto ao chegar, no Hospital Roosevelt, a 13 quarteirões do Dakota. A causa: hemorragias incontroláveis.

A nova celebridade, Chapman, está presa. Não precisa declarar nada. Pode exigir a presença de um advogado. Se não tiver dinheiro para pagá-lo, o Estado paga. É a lei. Se for chamado de assassino pela imprensa, um juiz poderá anular o julgamento, considerando-o preconceituoso contra o réu, presumindo-o culpado antes que um júri o condene ou absolva. É também a lei. Mas o provável é que se determine que Chapman é um psicopata, ou seja, passará o resto da vida num manicômio judiciário, vendendo direitos de lhe filmarem a vida, “escrevendo” memórias, vendendo entrevistas etc. Neste país tudo é faturável. A polícia já o chamou de “whaco” (demente, em gíria), pois a polícia conhece como ninguém como funciona o processo judiciário americano.

O canibalismo continua depois da morte. Fãs histéricos cercam o Dakota, cantando músicas dos Beatles. Ringo Starr, o primeiro dos ex-companheiros de Lennon a chegar aos EUA, de Londres, teve de ser protegido pela polícia, em face da malta de fãs que queriam depredá-lo, amorosamente, claro… A aventureira japonesa Yoko Ono, herdeira da fortuna dos 150 milhões de dólares de Lennon, também está representando “Madame Butterfly”, vítima trágica do destino, que lhe roubou o homem amado. Também há bons negócios à vista para a viúva. Todo mundo está faturando, de estações de rádio à TV, que tocam incessantemente as músicas dos Beatles e continuam o canibalismo do cadáver. É a sociedade do consumo, em seu aspecto mais grotesto.

John, Paul, Ringo, George, filhos da Guerra Fria

Em nenhuma época um conjunto de música popular fez tanto sucesso como os Beatles. De certa maneira, eles são o símbolo mais à mão da chamada contracultura da década de 1960. Nunca tiveram o prestígio entre as elites do movimento de um Bob Dylan (cujas letras parafraseavam poemas de Eliot e outros heróis do modernismo da alta cultura. Hoje Dylan é um “renascido em Cristo”, à la Jimmy Carter, apesar de judeu de ascendência), ou de Jimi Hendrix, considerado o supremo inovador do rock, que morreu, como sua par, Janis Joplin, de uma dose excessiva de drogas.

E só no início, que pouco chegou ao grande público, os Beatles tinha a agressividade da classe trabalhadora inglesa característica dos mais famosos produtos dos “Rolling Stones”, de Mick Jagger (cuja “The Citadel” nos diz mais sobre a guerra do Vietnã do que o excelente filme de Francis Ford Coppola, “Apocalipse agora”). Os Beatles se sofisticaram muito sob a mão de um gerente de gênio, Brian Epstein, outro viciado em drogas, que se suicidou em 1967, e que, homossexual, parecia exercer uma tutela absoluta sobre os quatro Beatles, Lennon, Paul McCartney, Ringo Starr e George Harrison.

O segredo dos Beatles, depois de “peneirados” por Epstein, é simples: limpeza. O rock nasceu uma mistura de jazz e música montanhesa americana, sob o signo das cadeiras rebolantes de Elvis Presley. Foi, apesar de adorado pela garotada, uniformemente condenado pela classe dirigente americana, de que Time era um dos símbolos (até 1968, quando perdeu quase todo o prestígio), e Time escreveu longos editoriais sobre a imoralidade de Elvis, “O Pelvis”, como o apelidaram.
Quando os Beatles chegaram ao quarteto final, depois de se chamarem “The Quarrymen” e outros nomes, eles, apesar de virem das favelas de Liverpool, faziam músicas românticas, chorosas, sem qualquer sofisticação de contexto e, depois que Epstein os vestiu de ternos e lhes aparou os cabelos (relativamente), os Beatles produziram um rock acessível aos valores da classe média, sem os “excessos” prévios e posteriores de Elvis e Jagger, respectivamente.

Eles se sofisticaram bastante musicalmente, em Sgt. Pepper’s, um disco divertido, de “Lucy” (supostamente sobre LSD, mas Lennon em entrevista a Playboy diz que foi tirado de Alice no País das Maravilhas. Ele pensa que isso confere inocência à música. Alice é bem mais pervertida do que LSD…), mas não há dúvida que foram as composições mais simples, “Love me do”, “I wanna hold your hand”, “Help” etc., que lhes angariaram os milhões de fãs, que lhes garantiram a venda de 250 milhões de discos, ou mais, o que levou John Lennon a dizer que o grupo era mais popular que Jesus Cristo.

Isso irritou muita gente. Nunca entendi por quê. Jesus não foi popular em vida. Terminou crucificado. Jesus não penetrou no mundo judeu, muçulmano e ateu. Os Beatles penetraram até na URSS (clandestinamente, no mercado negro, mas aos milhões…).

O charme da música deles sempre me escapou, o que deve ser um problema geracional (se bem que o antigo Dylan e o Jagger de “The citadel” e “Helter skelter” me diziam muito, não sempre agradável) de quem foi educado sob jazz “hot” e “cool” e o rápido mas inesquecível “bepop”, talvez o maior salto qualitativo da música popular neste século.

Mas, sociologicamente, eles sempre foram interessantes. Aquela choradeira infantil que os celebrizou, o romantismo quase hilariante de baladas como “Yesterday” representavam certamente o estado de espírito de uma geração que emergiu na década de 1960, depois que as tensões totalitárias da guerra fria se abaterem quando Kennedy e Kruschev decidiram não destruir o mundo em face da presença de mísseis nucleares soviéticos em Cuba, 1962.

As crianças da década de 1960, nascidas sob o ruído dos aviões a jato, dos mistérios da eletrônica, sob o terror nuclear, sem qualquer acesso ao poder democrático (…) crianças que nasceram quando os conceitos de religião, família e outras âncoras tradicionais haviam desaparecido sob o impacto da revolução capitalista-tecnológica-tecnocrática, tentaram criar o mundinho delas, de “quero segurar sua mão” e “socorro” (este quase um apelo direto). Renegaram a maneira de vestir, a maneira de pensar, a suposta ética de trabalho, de competição (a corrida entre ratos), o totalitarismo cultural da minha e precedentes gerações.
Era, claro, uma revolução impossível, pois, em verdade, foi faturada pelas mesmas forças capitalistas, tecnológicas e tecnocráticas que dirigem o mundo. A contracultura nada mais foi que uma variante da sociedade de consumo. As pobres crianças tentaram saída, recorrendo ao misticismo do Leste (no pseudomisticismo de Herman Hesse, na maioria dos casos), ao uso das drogas, o que equivale a montar num tigre (Quem monta num tigre acaba no estômago do tigre…) e, finalmente, encontraram uma causa na guerra do Vietnã, em que era possível, enfim, lutar contra (não por) alguma coisa, a crueldade inominável dos EUA, do establishment, no sudeste da Ásia.

A música foi naturalmente a linguagem mais acessível a essa geração.

Mas crianças envelhecem, Lennon está certo em dizer à Playboy que os Beatles não fazem mais sentido em 1980, que os Beatles eram os anos 60, ainda que o verdadeiro motivo dele seja o ódio incontido que revela nesta mesma entrevista contra seu ex-companheiro Paul McCartney (ele e John criaram a maioria das composições mais célebres dos Beatles), porque McCartney continua sendo o músico mais popular do mundo, enquanto que ele, John Lennon, teve uma década de 1970 repleta de fracassos.

O último disco que lançou Double fantasy, estava fazendo um certo sucesso e um compacto do dito, “Starting over”, está entre os dez mais vendidos. Mas Lennon permanecia muito atrás de McCartney. Ringo e Harrison nunca tiveram o mesmo destaque.

O último símbolo de um sonho impossível

Depois da morte de Epstein, os Beatles começaram a se dissolver. São dois os motivos: disputas de espólios da empresa em que eram sócios, a “Apple”, e, principalmente, as mulheres de John e Paul, Yoko Ono e Linda Eastman. Linda é herdeira da Eastman-Kodak, o que dispensa comentários.

Foi “groupie” de grupos de rock, ou seja, prestava serviços de cama a qualquer tamborineiro famoso, a pedidos. Conseguiu porém fisgar Paul McCartney e lhe domina a vida, inclusive participando do conjunto dele, Wings, apesar de não ter nenhum talento. É mais velha que Paul. Ele parece até hoje uma menina. Esse tipo de mulher é o que se chama eufemisticamente “órgão de alicate”. “Prende” o homem dela em partes vitais. E Linda não se deu com sua equivalente Yoko Ono, que John Lennon, órfão de mãe, bebê e abandonado pelo pai, chamava (e o que mais poderia ser?) de mamãe.

Foi o choque entre Yoko e Linda que provavelmente destruiu os Beatles. Yoko, japonesa, se autodescreve como “escultora” e da “alta sociedade de Tóquio”. É quase certamente uma gueixa, mas de “alicate”, e dominou completamente a vida de Lennon, o que ele confessa prazerosamente na entrevista à Playboy. Freud explica. Sempre explica.

Se Yoko se arrumou, soube dar a John Lennon fortuna e proteção.

No auge dos Beatles, Lennon favorecia causas radicais. Marchou contra a guerra do Vietnã. Fez experimentos perigosos com drogas, filmes que contrariavam a moral vigente (um sobre o próprio pênis), se tornou feminista etc. Sob Yoko, milionário, parecia mais criatura de astrologia, comedor de macrobiótica, “mãe de família” (ele cuida do filho do casal, Sean, de 5 anos, enquanto ela dirige os negócios da família), e, coisa inconcebível num radical, chagou a dar uma contribuição de mil dólares para a compra de coletes à prova de bala para a polícia de Nova York, a mesma polícia que sob o pretexto de que era drogado tentou deportá-lo até que todo mundo depôs a favor dele e conseguiu permanecer em Nova York, a polícia que não o protegeu do assassino quando morreu na cidade que mais amou.

A morte dele é o fim de uma época, talvez a última que conheçamos em que uma geração de jovens talentosos, como os Beatles, tentou humanizar o nosso mundo de poderes impiedosos, impessoais e letais. Que John Lennon tenha morrido um milionário egoísta, rancoroso, vivendo no casulo de uma japonesa aventureira, não diminui as boas intenções iniciais dos jovens revoltosos dos anos 60, ainda que o fim dele, mesmo antes de morrer, também revele a ingenuidade dos métodos e aspirações que abraçaram.

Com Lennon se foi, não só uma era, nos parece, mas um anseio de simplicidades que se tornaram aparentemente impossível em nosso tempo.

Maria Rita Kehl: como foi sua demissão do Estadão

A psicanalista Maria Rita Kehl foi demitida pelo Jornal O Estado de S. Paulo depois de ter escrito, no último sábado (2), artigo sobre a “desqualificação” dos votos dos pobres. O texto, intitulado “Dois pesos…”, gerou grande repercussão na internet e mídias sociais nos últimos dias.

Reproduzo entrevista concedida à jornalista Conceição Lemes, publicado no blog Viomundo:

Maria Rita Kehl (foto) é psicanalista, ensaísta e cronista. Tem seis livros publicados. O mais recente, O Tempo e o Cão, foi lançado em 2009, pela Boitempo. Nele, aborda o significado da depressão como sintoma psíquico da sociedade contemporânea. Maria Rita é a ganhadora do Prêmio Jabuti 2010 na categoria Educação, Psicologia e Psicanálise com O Tempo e o Cão.

Formada em psicologia pela USP, durante muitos anos se dedicou exclusivamente ao jornalismo cultural. Foi editora do Movimento, jornal que, ao lado do Opinião e d’O Pasquim, foi um dos mais importantes órgãos da imprensa alternativa durante o regime militar. Participou também da fundação do jornal Em Tempo e escreveu como freelancer para veículos, como Veja, Isto É e Folha de S. Paulo.

Em 1979, Maria Rita decidiu fazer mestrado em psicologia social. Sua tese: O Papel da Rede Globo e das Novelas da Globo em Domesticar o Brasil Durante a Ditadura Militar.

Em 1981, começou a atender pacientes — e nunca mais parou. Em 1997, doutorou-se em psicanálise pela PUC-SP com uma pesquisa que resultou no livro Deslocamentos do Feminino – A Mulher Freudiana na Passagem para a Modernidade (Imago, 1998).

Nos últimos oito meses, manteve uma coluna quinzenal no Caderno 2, em O Estado de S. Paulo. Nessa quarta-feira, ela foi demitida depois de ter escrito o artigo Dois Pesos, publicado no último sábado (2), onde abordou a “desqualificação” dos votos dos pobres.

Em entrevista na manhã de quinta-feira (7) a Bob Fernandes, da Terra Magazine, ela denunciou.

– Fui demitida pelo jornal o Estado de S. Paulo pelo que consideraram um “delito” de opinião (…) Como é que um jornal que anuncia estar sob censura, pode demitir alguém só porque a opinião da pessoa é diferente da sua?

[Ricardo Gandour, diretor do Estadão, deu entrevista mais tarde ao Terra Magazine, dizendo que não houve censura].

Em entrevista ao Viomundo, Maria Rita detalha os bastidores.

Na terça-feira, começou a circular na internet boatos de sua demissão. Antes, em algum momento, você foi alertada sobre “problemas” com os seus textos?

Nunca. Foi o que eu argumentei com a editora do Caderno 2, que me convidou para escrever a coluna. Na verdade, ela me chamou para escrever sobre psicanálise. Argumentei que só sobre psicanálise conflitava com o meu consultório. De vez em quando, disse-lhe, poderia escrever sobre o tema, mas eu gostaria mesmo era de escrever sobre tudo, inclusive política, assunto que me interessa muito. Ela aceitou.

Essa conversa foi…?

No final do ano passado, mas eu só comecei a escrever em fevereiro deste ano. Aí, fui escrevendo. Cada vez mais sobre política, pois ficando cada vez mais apaixonante. Eu já fui jornalista, tenho uma cabeça muito política também…

Após cada artigo, eu sempre perguntava: “E, aí, tudo bem?” Ela: “Tudo bem”.

Desta vez foi engraçado porque eu perguntei: “Tudo bem? Será que eles não vão pedir a minha cabeça?”. A resposta que veio: “Não vão, pode ficar tranqüila.” Eu fiquei. Imagino que a editora não iria me enganar…

Quando soube dos “problemas” com os seus artigos?

Na terça [5 de outubro]. Recebi um telefonema muito constrangido de que a coisa tinha ficado muito feia… cartas de leitores estavam reclamando muito da minha presença no jornal… tinha gente do Conselho Editorial muito enfurecida… a situação estava muito difícil. Ela lembrou de que a ideia inicial era que eu escrevesse sobre psicanálise…

“Bem, posso tentar escrever mais sobre psicanálise… Mas nunca mais escrever sobre política, isso não, isso eu não aceito”. Até porque o período em que o tema é mais polêmico é agora, depois relaxa…

Ela disse que iria conversar novamente com o Gandour [Ricardo Gandour, diretor de conteúdo do Grupo Estadão], que eu não conheço pessoalmente.

Aí, aconteceu uma coisa que eu não sei explicar, é um mistério. Mas acho que partiu de dentro do jornal, de alguém que ouviu essa conversa. Uma hora depois já tinha gente me ligando, para saber se eu tinha sido demitida.

O que a leva a suspeitar de que alguém do Estadão tenha passado a informação adiante?

Foi um detalhe da nossa conversa [entre a editora e Maria Rita]. Só alguém de dentro do jornal, que tinha ouvido a editora conversar comigo, tinha a informação… Tanto que o boato foi de que eu “estava proibida de escrever sobre política, só poderia escrever sobre psicanálise”.

Você pensou em divulgar?

Eu não tinha nenhum interesse em começar a divulgar, enquanto não tivesse a resposta. Eu não poderia criar um escândalo sem antes conhecê-la.

Acredito que ficou para eles [direção do jornal] a impressão de que fui eu que fiz toda a movimentação na internet. Até quis tornar público. Não fiz. E não porque sou boazinha. É porque não tinha nenhum interesse em divulgar antes de ter a resposta final do jornal.

Nessa quarta [6], depois da reunião que a editora teve com o Gandour, veio a resposta. Gandour disse que por conta da repercussão, a minha posição havia ficado insustentável, intolerável.

A repercussão na rede da sua demissão foi apenas pretexto…

É, a coisa já não estava boa. E por ter tido muita repercussão, ficou, segundo o jornal, insustentável. É como se eu tivesse organizado uma passeata petista na frente da redação com bandeiras vermelhas, com ameaça de exigências.

A minha demissão virou top10 do twitter. Eu não esperava. Fiquei atônita. Virou um acontecimento. A minha coluna era quinzenal… Eu não sou Jânio de Freitas nem nada… O fato é que virou um acontecimento na internet com muitas acusações contra o Estadão.

O seu trabalho foi censurado, concorda?

A palavra censura não é boa. No meu conceito, censura seria você não pode escrever sobre isso ou aquilo, corta uma linha aqui, outra ali… O que o meu caso demonstrou é que o jornal não permite uma visão diferente da do jornal nas suas páginas. É isso. Essa é dita imprensa liberal.

As grandes empresas que controlam a informação no país estão nas mãos de poucas famílias… Teoricamente seriam imparciais, dando voz ao outro lado, só que elas têm um posicionamento muito claro de que não são imparciais. Veja o meu caso. O meu artigo é assinado, não estou falando pelo jornal. Mas nem isso cabe.

Na verdade, os grandes veículos se dizem imparciais, alardeiam isso para a sociedade, só que a prática é oposta…

Eu acho honesto que o jornal assuma uma posição. É pior dizer que é imparcial e dar a notícia só com um lado. Isso confunde muito mais o leitor.

É pena que não tenha gente com dinheiro suficiente para apoiar outros candidatos. …Um grande jornal que apóie a Dilma, um grande jornal que apóie a Marina, um grande jornal que apóie o Plínio…

Na verdade, todos os jornais estão apoiando o mesmo candidato. Esse é o problema da política brasileira, da burguesia brasileira, da concentração do dinheiro na sociedade brasileira… Os donos dos jornais são parciais, mesmo… Ninguém é imparcial. Mas, para que os leitores sejam adequadamente informados e se posicionem, é fundamental ter o outro lado. Infelizmente, o que os donos dos jornais revelam é que não cabe voz a outra posição, nem mesmo em artigos assinados. Que liberdade de expressão é esta?

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