Analisando neurônios em laboratório, cientistas da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) conseguiram mostrar o motivo de medicamentos utilizados para o diabetes tipo 2 poderem atuar no cérebro dos pacientes com mal de Alzheimer, doença neurodegenerativa que leva à perda da memória.
A relação entre as duas doenças, segundo Fernanda De Felice, a principal autora do estudo publicado hoje na revista científica “PNAS”, é conhecida faz pouco tempo. Há cinco anos mais ou menos, calcula ela.
Agora, com a proteção de 100% obtida com neurônios que simulam os danos de Alzheimer a partir da aplicação da droga rosiglitazona (que estimula a ação da insulina nas células) – usada comumente para o diabetes-, está consolidado o cruzamento fisiológico das duas doenças.
A explicação, afirma De Felice, é que nos dois problemas existe uma resistência à insulina.
No caso específico da doença neurológica, descobriu-se agora que os neurônios em cultura não captam a insulina por causa da presença de substâncias tóxicas chamadas oligômeros. “Mas a droga, quando aplicada, impediu que essas substância tóxicas se ligassem com os receptores específicos”, disse De Felice à Folha.
Assim, a insulina ficou mais livre para agir sobre os neurônios e fazer com que os estímulos elétricos circulassem pela rede neuronal, possibilitando a construção da memória.
Apesar de os resultados obtidos em laboratório serem positivos, a pesquisadora da UFRJ, que fez o estudo com parceiros brasileiros e americanos, é cautelosa em relação à possibilidade de aplicação clínica imediata da descoberta. “Os nossos dados não significam que as pessoas com Alzheimer podem sair tomando insulina por aí.”
Os riscos para a saúde, neste caso, seriam altíssimos. “No futuro, o caminho será desenvolver uma droga que possa agir diretamente sobre os neurônios e não sobre todo o organismo”, diz De Felice.
O trabalho feito agora ainda precisa ser repetido em camundongos transgênicos, animais de laboratório preparados para desenvolver sintomas do mal de Alzheimer. Os testes tentarão reverter a doença em estágio bem avançado.
O trabalho de pesquisa básica feito no Rio de Janeiro e nos Estados Unidos, afirma De Felice, é importante porque ajuda a mostrar, com precisão, como é a conexão entre o diabetes tipo 2 e o Alzheimer.
Hoje, nos Estados Unidos, existem vários testes sendo feitos em seres humanos tentando mostrar se a droga rosiglitazona diminui a resistência à insulina, fator bastante presente nos cérebros dos pacientes com a doença de Alzheimer.
Entre os vários testes em andamento, conduzidos tanto pela indústria quanto por grupos de pesquisa, nenhum teve os seus resultados finais divulgados ao público.
O caminho agora está mais pavimentado, na visão da cientista, em direção ao desenvolvimento de tratamentos que possam ser eficazes para o problema de perda da memória.
“Os medicamentos [usados no estudo] protegem as sinapses dos neurônios contra os danos causados pelos oligômeros. Esse dado, finalmente, poderá resultar em tratamentos eficazes que previnam a perda de memória que ocorre na doença de Alzheimer.”
Intoxicação neuronal sugere nova forma da doença metabólica:
Alguns pesquisadores que estudam a relação entre insulina e a intoxicação neuronal defendem que esse novo mecanismo, que pode levar à perda da memória, deve ser um novo tipo de diabetes, o 3. Como a insulina desempenha no cérebro um papel importante em processos relacionados à formação de memória, o quadro de resistência dos neurônios à ela prejudicaria esse registro. Nesta associação, o Alzheimer seria uma espécie de diabetes. Os médicos sabem que no tipo 2 da doença já ocorre algum prejuízo para a memória.
FSP
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