É o próprio Barack Obama quem diz: Jon Favreau é o meu “mind reader”. Aos 27 anos (e não parece um ano mais velho que isso), com muito café e muitas latas de Red Bull, Favreau não sabe apenas ler os pensamentos de Obama. Sabe também passá-los para o papel, estruturá-los, para que Obama os devolva às multidões, em frases eletrizantes. O discurso de posse também é seu. Passou semanas e semanas trabalhando nele. Hoje, tornou-se no mais jovem “speechwriter” presidencial.
A revista “Newsweek” escreveu que Jon Favreau tem o pior e o melhor trabalho na história dos redatores de discursos. O pior, porque o seu patrão é alguém que, na verdade, não precisaria da sua ajuda, já que escreveu sozinho não apenas dois “best-sellers” “Dreams from My Father” (“A Minha Herança”) e “The Audacity of Hope” (“Audácia da Esperança”), como o discurso que o levou para a fama nacional, em 2004, na Convenção Nacional Democrata. “Ao mesmo tempo, o mesmo patrão é capaz de discursar de uma forma que faz o seu auditório ficar arrepiado.” E não deve haver muito melhor do que isto para quem ganha a vida a escrever para os outros.
Favreau tinha apenas 23 anos, recem formado no College of the Holy Cross em Worcester (Massachusetts). Conta o “New York Times” que Obama estava ensaiando o discurso da Convenção, nos bastidores, quando Favreau, que fazia parte da equipe do candidato democrata às presidenciais, John Kerry, o interrompeu: havia um problema de ritmo no discurso. “Ele olhou para mim, um bocado confuso, tipo: ‘Quem é este garoto?’”, conta Favreau.
O “garoto” era já speechwriter de Kerry, por puro acaso. Estava na hora certa no local certo, no momento em que a campanha do democrata estava prestes a implodir.
Favs, como é conhecido entre os amigos, decorou o discurso de 2004 palavra por palavra, andou sempre com os livros de Obama debaixo do braço, em particular a autobiografia “Dreams from My Father”. E o dono da voz confundiu-se com a voz do dono.
Quando Obama venceu a nomeação democrata contra Hillary Clinton (que atacara os dons de oratória do rival: “As campanhas fazem-se com poesia, mas a governaça é com prosa”), os dois levaram meia hora para chegar à frase que abriria o discurso de vitória: “Diziam que este dia nunca chegaria”.
Quando Obama enfrentou a polêmica com um discurso sobre o racismo que incendiou negros e brancos e foi qualificado de histórico por centenas de jornais – “A raiva é real, é poderosa e o simples fato de desejar que desapareça, ou condená-la sem entender suas raízes, só serve para aumentar o abismo da falta de entendimento que existe entre as raças” -, a pluma de Favreau já estava cumprindo seu trabalho. Cinco meses depois, em Denver, quando Obama colocou no bolso os delegados democratas com seu discurso para uma platéia de 38 milhões de telespectadores – “Temos mais riqueza que ninguém, mas isso não nos torna ricos. Temos as maiores forças armadas da terra, mas não é isso que nos faz fortes. Nossas universidades e nossa cultura são a inveja do mundo, mas não é por isso que o mundo se aproxima de nós. É o espírito americano, essa promessa americana que nos empurra quando o caminho se torna incerto. Essa promessa constitui nossa maior herança” -, Favreau também havia feito seu trabalho. Na noite em que Obama ganhou as eleições e pronunciou um discurso em Chicago – “Se ainda resta por aí alguém que duvida que os EUA são um lugar onde tudo é possível…” – que comoveu milhões de cidadãos, Favreau também tinha pronto o da derrota, caso seu chefe perdesse.
O discurso que Obama pronunciou nesta terça-feira ficará para a história como seu discurso, mas Favreau também levará sua parte de reconhecimento. Nos EUA, os redatores que escrevem para outras pessoas são chamados de fantasmas (“ghost writers”). Robert Schlesinger, escreveu em seu blog que a chave do sucesso de um fantasma é saber captar a voz de seu chefe, que tenham trabalhado muito tempo lado a lado e que o chefe confie plenamente nele.
Favreau estava sempre com Obama. Deitava-se às três da manhã, levantava-se às cinco. Ia para os Starbucks encher-se de cafeína para aguentar o sono enquanto escrevia no seu computador. Desde que Obama ganhou as presidenciais, em 4 de Novembro, que o ritmo ficou ainda mais frenético, para preparar o discurso de posse.
“O que faço é sentar-me com ele durante meia hora. Escrevo tudo o que ele diz. Refaço, escrevo. Ele escreve, refaz. É assim que o produto fica acabado.” Quando trabalhamos com o senador Obama, o principal ator do discurso é ele, diz.